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Troca-troca em Brasília é sexo explícito

Amorim não enxerga mais o Brasil lá fora
publicado 28/07/2017
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O Conversa Afiada reproduz trechos de entrevista concedida por Celso Amorim, o melhor chanceler do mundo, a Júlia Dias Carneiro, da BBC Brasil:

BBC Brasil - Primeiro queria saber como o senhor vê a política externa do Brasil no momento. A gente viu muitas guinadas no país ao longo do último ano e agora o governo acaba de assumir a presidência do Mercosul...

Celso Amorim - (interrompendo) Mal se percebe, não?

BBC Brasil - Como o senhor vê o papel que o Brasil está desempenhando?

Amorim - A política externa obviamente teve uma queda brutal. Você não percebe mais a presença do Brasil. Eu me recordo que, quando presidia reuniões do Mercosul, eram entrevistas sem parar, jornais, canais de TV, sempre tinha uma coisa nova, algo palpitante, ainda que fosse para criticar. Agora, não tem nada. Dá impressão que você está cumprindo tabela.

O Brasil estava presente em quase tudo que aconteceu de importante no mundo, da Rodada de Doha às questões da reforma da ONU, passando pelo Oriente Médio, Teerã, integração da América do Sul... Hoje, o que eu vejo é uma coisa passiva. Nos melhores momentos é passiva. Nos piores, é desastrada.

BBC Brasil - O Brasil assume o Mercosul em um momento de crise acirrada na Venezuela. A situação está crítica, com a eleição da Assembleia Constituinte convocada pelo presidente Nicolás Maduro marcada para domingo. Como o senhor vê as ações do Brasil em relação à Venezuela?

Amorim - O governo brasileiro adotou uma posição de crítica tão frontal ao governo venezuelano que deixou de ser um interlocutor. Na situação atual, o Brasil sumiu. Porque se colocou em uma posição em que não há diálogo.

E em vez de ter presente que o mais importante é a paz na Venezuela, a paz social e política, resolveu tomar um lado, e o lado contrário ao do governo. Eu não vou entrar nem no mérito das posições do governo Maduro, mas se você quer agir como um país que tem influência, você não pode tomar partido.

(...) 

BBC Brasil - Após o impeachment, a ex-presidente Dilma Rousseff visitou diversos países para falar sobre seu afastamento e transmitir a perspectiva do PT de que ela foi vítima de um golpe. O senhor acha que a comunidade estrangeira se convenceu de que teria havido um golpe?

Amorim - Olha, eu acho que essas coisas semânticas... Eu, pessoalmente, acho que foi um golpe. As formalidades foram seguidas, o Supremo Tribunal Federal e o Congresso estão funcionando, então não é um golpe militar, claro. Mas se você teve uma eleição que elegeu uma chapa com um determinado projeto de país - pode até ter errado na execução, isso é outro problema - mas um projeto que pressupõe maior inclusão social, autonomia na política internacional, não incluía privatizações como as que estão sendo feitas agora, nada disso. E você substitui, através do impeachment, por um projeto oposto - isso é um golpe, a meu ver. Ainda que os meios não tenham sido ilegais do ponto de vista formal.

A sensação que eu vejo fora do Brasil é de perplexidade. As pessoas nem entendem o que está acontecendo no Brasil. As condenações do Lula são percebidas como uma coisa política, direcionada. Como você pode comparar o Lula, um homem que a maioria ainda responde que foi o melhor presidente do país, com o Eduardo Cunha, gente? O sujeito tinha contas na Suíça, é um manipulador. São entidades totalmente diferentes. Isso já mostra que a cabeça dessa pessoa que julgou não é uma cabeça... sei lá. Não vou falar mais nada.

BBC Brasil - Mas o Lula foi condenado em primeira instância pelo juiz Sérgio Moro e enfrenta quatro outros processos. Como o senhor vê a sucessão presidencial para 2018?

Amorim - Primeiramente, eu presumo que não pode haver um cenário presidencial sem o Lula. Nessa coisa não tem que ter plano B.

As eleições de 2018 serão muito importantes, e temos riscos até da (ascensão de um candidato de) extrema-direita, graças à campanha feita no Brasil. O objetivo foi desmoralizar o PT, mas desmoralizou a política. Os candidatos que se apresentam como não-políticos, da extrema-direita ou da direita mesmo, podem se beneficiar disso.

O Lula é a única pessoa que tem capacidade de mobilizar o povo para derrotar essas ameaças de direita e de extrema-direita. Não é nem para ganhar do PSDB tradicional, não, é para ganhar de pessoas que são antipolíticas e antidemocráticas.

BBC Brasil - Mas para além das dúvidas que pairam sobre o futuro político do Lula, ele enfrenta uma série de acusações de corrupção. Como isso se concilia com a ética demandada por um candidato a presidente?

Amorim - Mas você tem que se perguntar por que esses processos foram abertos. Não existe materialidade do crime. "Por que tinha intenção?" Como é que você faz uma relação de causa e efeito para aferir um eventual benefício para uma empresa? São coisas totalmente descabidas.

Criminalizaram o fato de o Lula receber determinada quantia pelas palestras que fez. Gente, isso é o que faz o Clinton, o Bush... já que a gente gosta de ver exemplos fora. Quase todos esses líderes têm uma fundação. Você acha que eles tiraram dinheiro do bolso deles para botar na fundação? O Instituto Lula é auditado com uma lupa que eu nunca vi aplicada a outros institutos. Eu não tenho nada contra o Instituto Fernando Henrique Cardoso, acho bom que haja. Mas são critérios diferentes, nunca ninguém nunca pensou (em fiscalizar).

(...) 

BBC Brasil - O que o senhor diz que é quase sexo explícito? As negociações entre o governo e o Congresso? O toma lá dá cá?

Amorim - Isso. É impressionante. Na frente de todo mundo. Eu nunca vi isso. Falaram tão mal da Dilma, mas a Dilma não mudou a composição de Comissão nenhuma (referência à substituição de última hora de membros da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados em julho para rejeitar denúncia contra Temer). E isso de pessoas do mesmo partido, como o deputado que soube pelo jornal que tinha sido substituído por outro.

(...) 

BBC Brasil - A operação Lava Jato descortinou esquemas de corrupção de empreiteiras, sobretudo da Odebrecht, muito além das fronteiras brasileiras, incluindo nos países africanos dos quais o Brasil se aproximou durante o governo Lula, como parte da política de aproximação Sul-Sul. Diante da corrupção revelada, como o senhor olha para essa estratégia em retrospecto?

Amorim - Olha, o que as empresas brasileiras fizeram, eu não sei. E não sabia. Agora, também posso dizer que não é diferente do que fizeram empresas francesas, espanholas, americanas, porque era como essas empresas agiam.

Empresas americanas, alemãs, também foram acusadas disso ou daquilo. A Volkswagen, por exemplo, com aquele software (que mascarava as emissões de carbono). Claro que ninguém vai justificar essas coisas erradas, mas não é por isso que você vai fechar a possibilidade de estar presente em outros países.

Se propinas foram pagas, isso é lamentável e tem que ser punido. Mas eu nunca vi uma campanha acirrada, nem da justiça americana, nem da justiça alemã, para destruir todas as suas empresas. Você teria que ir corrigindo as coisas, mandar embora as pessoas ligadas àquelas práticas, e ir consertando.

Aqui, o nível de colaboração com a justiça estrangeira, com países mais poderosos que o Brasil, é uma coisa que nunca vi acontecer. São assuntos nossos, para serem resolvidos aqui.

(...)