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Moradores do Horto rejeitam proposta do governo

"Tem gente que quando tem um despejo aqui solta fogos, lá no Alto Jardim Botânico, é um pessoal que tem visão de casa grande"
publicado 08/05/2013
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Saiu no blog do deputado Edson Santos:

Horto rejeita decisão do Governo


Reunidos com representantes do Ministério do Meio Ambiente (MMA), da Advocacia Geral da União (AGU), da Secretaria de Patrimônio da União (SPU), da Casa Civil e da Secretaria Geral da Presidência da República, os moradores do Horto Florestal rejeitaram a proposta de delimitação do Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro (IPJB) apresentada pelo Governo Federal. O encontro, que aconteceu na noite desta terça-feira (07.05) na quadra do Clube Caxinguelê, reuniu cerca de 500 pessoas.



De acordo com a proposta do Governo, apresentada mais cedo pela ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, o Jardim Botânico será demarcado com uma área de 132,5 hectares, englobando os imóveis de 520 dentre as 621 família da comunidade, que precisariam ser realocadas.



No início da reunião com os moradores, coube ao assessor do MMA Luiz Antônio Correia de Carvalho ser o portador das más novidades. “Trago notícias muito dolorosas, que resultam do trabalho de vários órgãos de governo”, disse, explicando que naquele dia encerrava-se o prazo estabelecido pelo Tribunal de Contas da União (TCU) para a identificação do perímetro do Jardim Botânico, nunca demarcado desde a criação da instituição em 1808. Ele afirmou que o Governo tomou como ponto de partida os “limites históricos” definidos pelo tombamento feito pelo Instituto Nacional do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) em 1973. E que permanecerão no interior do novo perímetro apenas a Escola Municipal Júlia Kubitschek, uma subestação de energia da Light e o prédio do Tribunal Regional Eleitoral, cujas instalações  passarão a ser utilizadas pelo IPJB.



Cadastro – De acordo com Carvalho, o Governo tomou esta decisão pelo fato de que correm na Justiça cerca de 250 ações da própria União contra a comunidade, 130 das quais já transitadas em julgado, que determinam o despejo sem qualquer indenização ou previsão de reassentamento. Para ele, a partir da delimitação do perímetro, o Governo poderá atuar junto à Justiça por meio da AGU para frear estas ações e encontrar, com apoio da SPU e da Caixa Econômica Federal, as melhores soluções habitacionais possíveis para os moradores do Horto. “As pessoas estão sendo insultadas como se fossem invasoras, o que o Governo reconhece que não é verdade”, disse.



A secretária nacional de Patrimônio da União, Cassandra Nunes, falou aos moradores sobre a necessidade de atualizar o cadastro feito em 2010 com cada dos moradores do Horto. A tarefa deverá ser cumprida em 30 dias pelo escritório de apoio que a SPU vai montar na Rua Major Rubens Vaz, 122. “Ninguém vai ser mandado para a caixa-prego. Dentre as opções que estamos analisando estão os melhores terrenos da União em termos de localização no Rio de Janeiro. Mas é preciso atualizar o cadastro pois existe uma solução diferente para cada faixa de renda”, disse.



Crítica – Participando da mesa como convidado, o jurista Miguel Baldez, membro ativo do Conselho Popular do Município do Rio de Janeiro e historicamente dedicado ao direito à moradia das comunidades populares, foi duro em suas críticas à proposta do Governo. “Acho importante esta reunião, principalmente pela coragem do governo de vir perante vocês dar uma má notícia. (...) Mas estar na mesa não significa que eu estou de acordo, e eu pedi vênia para dizer isso. Essas ações realmente têm sentenças transitadas em julgado. Mas tudo fazia crer que o Governo tinha modificado a sua intenção relativa à destinação dessa terra. Seria rigorosamente perfeito que este projeto do Jardim Botânico, desenvolvido aqui de uma maneira extremamente insistente pela administração do senhor Lizst Vieira, fosse substituído por um outro mais adequado aos projetos de governo da presidenta Dilma Roussef, mantendo a moradia dos habitantes desta região”.



“Já aconteceu antes da própria Advocacia da União requerer suspensão de determinadas execuções de mandado. Bastava que a AGU dissesse: não, a terra é federal, a terra é da União, está transitado e julgado e agora a União dá o destino que bem entender a esta terra. É um direito constitucional da União. Só não faz se não quiser, e parece que não quer”, criticou Baldez.



Limites contestados – Nascido na comunidade, o deputado federal Edson Santos (PT-RJ) também criticou a proposta governamental. “Defendo o Governo Dilma com coração. Mas quero dizer que discordo da decisão. Temos que alertar o Governo para este erro. Não é o meio ambiente que ganha com isso. Tem gente que quando tem um despejo aqui solta fogos, lá no Alto Jardim Botânico. Sabe o que eles querem? Querem competir com o Jardim Pernambuco, que é a área mais valorizada do Rio de Janeiro. Sabe o que eles dizem? Que aqui é mais chique! Quer dizer, é um pessoal que tem visão de casa grande. E para eles nós somos parte da senzala. Só que essa senzala não vai aceitar que a turma que pensa que manda nesse país faça daqui o seu quintal. (...) Houve uma ducha de água fria com a informação que aqui chegou, mas não vamos abaixar a cabeça. Vamos à luta, fazer depois desta reunião uma análise tranquila de quais caminhos vamos seguir”, disse o deputado.



A historiadora Laura Olivieri, que desenvolveu tese de doutorado sobre o Horto e acompanha a comunidade há mais de dez anos, questionou os supostos “limites históricos” apresentados pelo MMA. “É preciso que se chamem geólogos e historiadores para compor a equipe de decisão do perímetro do Jardim Botânico, porque o limite histórico nunca foi o que se compõe atualmente. O limite ia da Escola Juscelino Kubitschek até o portão que ainda existe na fronteira com o núcleo do Caxinguelê. Foi esta comissão de frente aqui (referindo-se aos idosos que ocupavam a primeira fileira da reunião) que me contou esta história. Vale ressaltar que tecnicamente os documentos oficiais do IPHAN valem tanto quanto a memória deste povo. Ele pode ser tão forjado quanto qualquer versão de memória pessoal. É igual para a história”, argumentou.



A luta continua – Para a presidente da Associação de Moradores do Horto (AMAHOR), Emília Maria de Souza, a situação não está decidida. Ela explicou que vai conversar com os advogados da entidade para encontrar alternativas jurídicas. Pretende ainda insistir junto ao Governo para que seja retomado o projeto elaborado em 2010 pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFRJ, feito sob encomenda da SPU, que conciliava a expansão das áreas de pesquisa do IPJB com o remanejamento de algumas famílias para outras localidade do próprio Horto.


“Sabemos perfeitamente que existem leis que nos beneficiam. Nós temos direito à moradia nesta terra. Se a gente aceitar, legitimando esta decisão, quem vai sair ganhando não é o Jardim Botânico. Mas a elite que está aí ansiosa por ocupar o espaço em que hoje nós vivemos. Hoje de manhã ouvi os fogos de artifício comemorando a decisão. Já estão festejando. Mas eu acredito que muita água ainda vai rolar por baixo desta ponte. Vai depender da gente. (...) Vamos virar este jogo sim. E com consciência de que estamos agindo legitimamente. Não acredito que o Governo Federal, que tem uma proposta popular, vai bancar esta decisão até o fim. Porque esta proposta não é em benefício da questão ambiental. É em benefício da especulação imobiliária. E isso, minha gente, por uma questão de honra, nós não podemos permitir”, concluiu Emília.

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Deputado federal Edson Santos (PT-RJ)