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O que perguntar a Moro na Câmara

Ou seria na "câmera"? Quá, quá, quá!
publicado 18/06/2019
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Do escritor e jornalista Homero Fonseca, em seu blog:

10 perguntas a Moro

Se eu fosse senador, quarta (19), na Comissão de Constituição e Justiça…

1 — O Sr. cursou o programa de instrução de advogados da Harvard Law School em 1998 e participou de programas de estudos sobre lavagem de dinheiro promovido pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos. Durante a Operação Lava Jato, o senhor manteve contato com alguém ligado a alguma instituição americana? Qual instituição? Quando? Com quem? E sobre o que conversaram? Quantas vezes nesse período o senhor viajou aos EUA?

2 — Em seu célebre artigo sobre a Operação Mãos Limpas, na Itália, o senhor enfatiza que a Mani Puliti somente foi possível pela atuação dos chamados pretori d’assalto (juízes de ataque). O senhor se comportou exatamente assim durante a Lava Jato. O senhor se considerou um juiz de assalto. O senhor achou que, porque tinha apoio cerrado da grande mídia, havia ganho “legitimidade direta da opinião pública” e por isso podia atropelar as leis, como vazar ilegalmente uma conversa de uma Presidenta da República. Agora que suas intenções, sua parcialidade estão vindo a público, o senhor ainda acredita nessa estratégia? Continuará agindo como se estivesse acima da Lei?

3 — Agora o senhor é quem está sendo vítima de vazamentos. Mas o senhor sempre foi um mestre dos vazamentos. Elogiou o método, no referido artigo, registrando de forma aprovativa que “a investigação vazava como uma peneira”. E explicou: “Tão logo alguém era preso, detalhes de sua confissão eram veiculados no L’Expresso, no La Republica e outros jornais e revistas simpatizantes.” O senhor usou a mesma tática. Quem são os veículos “simpatizantes”, no seu caso? Com quais órgãos de imprensa o senhor mantinha contato mais frequente durante a Lava Jato? E que tipo de contatos eram esses? Por que o senhor, se não tem nada a esconder, não abre seu sigilo telefônico?

4 — No mesmo artigo sobre a Mãos Limpas, o senhor relativiza a presunção de inocência, um dos pilares do nosso Direito. Com efeito, na Lava Jato inúmeros dos seus atos demonstram claramente haver o senhor partido de uma “presunção de culpa” do ex-Presidente Lula e do PT. Uma rápida olhada no noticiário revela uma sincronização entre suas ações e o momento político: no dia 4 de março de 2016, o senhor determinou, sem justificativa convincente, a condução coercitiva de Lula, apenas nove dias antes das passeatas pró-impeachment já marcadas. O fato atiçou as turbas de uma classe média inflamada que foram às ruas no dia 13 em todo o país, gritar “Fora Dilma”. No dia 16, o senhor, numa ousada jogada, determinou ilegalmente o vazamento das conversas entre Lula, a Presidenta Dilma, familiares e advogados, impedindo assim a nomeação do ex-presidente para o Ministério. O ministro Teori Zavacki condenou a iniciativa mas, confiante na sua popularidade de justiceiro, o senhor pediu desculpas e seguiu em frente.

Posteriormente, em ações espetaculares, dois ex-ministros dos governos Lula e Dilma foram presos — Mantega, no dia 22 de setembro (em pleno hospital, quando visitava a mulher em grave estado de saúde, e liberado no dia seguinte porque pegou mal) e Palocci, no dia 26. Estávamos às vésperas das eleições municipais de 2 de outubro.

Tem mais: no dia 01 outubro de 2018, faltando seis dias para as acirradas eleições presidenciais, o senhor, sem justificativa convincente, liberou parte da delação de Palocci incriminando Lula e o PT. Numa perspectiva história, há um evidente sincronismo entre suas decisões “imparciais” e decisivos acontecimentos políticos. Especialistas internacionais, como o professor de Havard, John Comaroff, antropólogo estudioso do chamado lawfare — uso político da justiça –, consideram que a Operação Lava-jato violou a lei para criar “presunção de culpa” de Lula. O senhor nega a sincronia evidente desses fatos? Sustenta, diante de todas essas evidências, que são simples coincidências?

5 — O senhor condenou Lula à prisão em 12 julho de 2017. No dia 04 de abril de 2018, o STF negou o habeas corpus de Lula, por 6 votos a 5; no dia seguinte, o TRF4 autorizou o senhor a decretar a prisão de Lula. Dezenove minutos depois, o senhor expediu o mandado de prisão. A Justiça brasileira, neste caso, deve ter batido o recorde mundial de celeridade. O fato revela claramente um ânimo condenatório contra Lula. Ou o senhor costuma ser tão rápido em todas as ações? Pode dar exemplos ou está com amnésia?

6 — No dia 08 de julho de 2018, um desembargador de plantão do TRF4 concedeu um habeas corpus a Lula. O senhor se encontrava de férias. Mesmo assim, conforme noticiário da imprensa sobre o célebre caso, o senhor se insurgiu contra a decisão de um superior hierárquico. É verdade que naquele dia o senhor se encontrava de férias, em Portugal? É verdade que o senhor ligou para delegado da PF instruindo-o a manter Lula preso? O senhor se comunicou com o presidente do TRF-4 naquela ocasião? Com quem mais o senhor se comunicou naquele dia inesquecível?

7 — Em relação às atuais denúncias de cumplicidade entre o senhor e os procuradores da Lava Jato, o site jornalístico Intercept em nenhum momento revelou sua fonte (direito assegurado à imprensa), nem nunca citou um hacker. Com base em que o senhor afirma que foi hackeado, antes mesmo de qualquer investigação? Quais seus “elementos de convicção” nesse caso? Ao mesmo tempo, o senhor mandou a PF investigar a “atividade criminosa” do suposto hacker. Sendo chefe da PF e estando no centro das acusações, por que o senhor não se afastou até agora, temporiamente, do Ministério da Justiça, como é da boa praxe governamental? O senhor não enxerga nenhum conflito de interesse em sua postura, nenhuma suspeição? Veículos de imprensa que sempre o apoiaram, como a Veja e o Estadão, pediram abertamente sua renúncia. Quando os apoiavam, eles estavam certos? E agora, estão errados, defendendo a “atividade criminosa de um hacker”?

8 — Tentando defender-se das sérias acusações, o senhor tem se comportado como uma biruta midiática: ora diz que é tudo falso, um “plano criminoso” de um suposto hacker para atacar a Lava Jato; ora, admite fatos como verdadeiros, confessando um “descuido” ou não enxergando “nada demais” na sua parceria fora dos atos processuais com o Ministério Público; ora, procura o benefício da dúvida, afirmando não se lembrar de fatos recentes e importantes. Afinal, qual é sua linha de defesa? Por que ao mandar investigar o caso, o senhor enfatiza o como as informações foram obtidas, mas deixa de lado o conteúdo das conversas?

9 — A se confirmar a veracidade das mensagens divulgadas pelo Intercept — o que o senhor admitiu, pelo menos parcialmente, ao confessar um possível “descuido” — o senhor transgrediu frontalmente as leis e o próprio Código de Ética da Magistratura, que reza em seus artigos 8º e 9º que o juiz “deve manter ao longo de todo o processo uma distância equivalente das partes, e evitar todo o tipo de comportamento que possa refletir favoritismo, predisposição ou preconceito” e ainda que “cumpre dispensar às partes igualdade de tratamento”. Ao contrário, os advogados da defesa do réu sempre se queixaram de sua parcialidade e denunciaram sua suspeição. Comunicar-se frequentemente com os acusadores, trocando ideias, articulando ações e passando orientações, num canal secreto da internet — e, portanto, às escondidas da outra parte, dos demais órgãos do próprio Judiciário e da Imprensa — na sua opinião é conduta normal e ética?

10 — As “10 medidas de combate à corrupção” propostas pelo Ministério Público e apoiadas pelo senhor, atualmente em tramitação no Congresso, validam “provas ilegais colhidas de boa-fé”. No caso do Intercept, tudo transcorre dentro da boa fé jornalística, cuja missão é informar o público, mesmo quando as notícias contrariem autoridades e interesses. O senhor mudou sua posição ou ela só é válida para os outros? Em outras palavras, o senhor pensa que detém o monopólio da boa fé?

Em tempo: sobre a troca de "Câmara" por "câmera".

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