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A privatização é um embuste. (Na Inglaterra)

Aqui se chama de Privataria e seu Principe é levado a sério ...
publicado 12/07/2014
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Diante do fracasso da BrOi e sua iminente re-estatização

Com a errática reação do Arrocho Neves de proteger  a Globo da "limpeza" do futebol brasileiro.

Com a volta do Principe da Privataria ao palanque presidencial e do chefe do clã da Privataria Tucana à disputa do Senado por São Paulo (só podia ser em São Paulo, berço do malufismo, janismo, ademarismo  ...) ...

Por tudo isso, o Conversa Afiada resolveu oferecer aos amigos navegantes o artigo de Seumas Milne, no The Guardian inglês, em 9 de julho de 2014.

É uma singela homenagem aos colonizados que esperam do Hemisfério Norte as Tábuas da Lei:


A maré se volta contra o embuste da privatização



O renascimento internacional da propriedade pública é anátema ao mundo da elite.  Mas, é vital para a recuperação genuína da Economia.

A privatização não está funcionando. Nos prometeram democracia acionária, competição, custos reduzidos e serviços melhores.  Após uma geração, a experiência da maior parte das pessoas tem mostrado o oposto.  De energia a água, ferrovias a serviços públicos, a realidade tem sido monopólios privados, subsídios perversos, preços exorbitantes, sub-investimentos lastimáveis, exploração e aprisionamento corporativo.

Os cartéis privados ditam as regras aos reguladores.  Consumidores e políticos são ludibriados pelo sigilo comercial e complexidade contratual.  A massa trabalhadora tem seu salário e condições de trabalho  reduzidos.  O controle de serviços essenciais passou para gigantes corporativos com base em outros países e frequentemente de propriedade do Estado.  Dessa forma, as empresas e serviços privatizados apenas passam para as mãos destes outros Estados.

Relatórios e mais relatórios tem mostrado que serviços privatizados são mais caros e ineficientes do que a contrapartida de propriedade pública.  Não é surpresa que a maior parte das pessoas que nunca apoiaram uma única privatização, não acredite nos privatizadores e nem queiram seus serviços administrados por eles.

Mas, independente das evidências, a caravana continua.  O governo de David Cameron (Primeiro-Ministro do Reino Unido) está dirigindo a privatização, agora, para o coração da Educação e Saúde, terceirizando o Serviço de Provação (instituto para tratamento de delinquentes jovens) e vendendo uma parte do Royal Mail (o serviço postal nacional do Reino Unido) por mais de um bilhão a menos do que o preço de mercado, com membros do próprio governo manipulando a situação para que seja antecipada.

Nenhuma soma de falhas desastrosas e malfeitos fraudulentos parece impedir empresas como G4S, Atos e Serco de firmarem contratos que já somam 80 bilhões de libras em negócios.  Tal grupo de empresas ainda exerce enorme influência sobre Westminster e Whitehall (centro administrativo do Reino Unido)

Pode-se pensar que isso é um prato cheio para a Oposição – e não há melhor exemplo do que o ralo de dinheiro que é o sistema ferroviário britânico privatizado, que tem sido o maior exemplo de disfunção da privatização.  Forçar mercados privados a um monopólio natural tem causado fragmentação, investimentos baixíssimos, custo anual de 1.2 bilhões de libras, as tarifas de trem mais caras da Europa, e mais do que o dobro do subsídio público necessário antes da privatização.

A linha East Coast de propriedade pública, em contraste, tem provido serviço muito melhor e entregue 800 milhões de libras para o Tesouro público (não diferentemente da Scottish Water, também de propriedade pública).  Então, naturalmente, a aliança que governa a venderá, enquanto o partido trabalhista, o Labour agita-se para apoiar a demanda altamente popular de renacionalização.

O deputado trabalhista Ed Balls, ministro na “sombra” da Fazenda, agora defensor da chama oscilante do New Labour (o Labour vestido com uma nova marca, que vigorou de meados dos anos 90 até o início dos anos 2 000 para reganhar a confiança do público no partido), insiste em que “propriedade pública” seria “ideológica”.  Os aproveitadores do sistema ferroviário e os barões das corporações, alarmados pelos planos de Ed Miliband – líder da Oposição trabalhista no Parlamento -  de congelar os preços da energia privatizada, concordam.  Então, o Labour está jogando com uma casa dividida, onde franquias continuam, mas o setor público tem o direito de concorrer, bem como os privatizadores, ao direito de administrar empresas e serviços.

É um preço alto que se paga por essa confusão.  A nacionalização do sistema ferroviário tem a vantagem de não apenas ser popular, mas inteiramente livre, ao passo que cada franquia pode ser trazida de volta ao controle público à medida em que expira.  Resistir a tais circunstâncias só é possível a custa dos lobbies corporativos e ideologia de mercado.

Mas,  a necessidade de quebrar 30 anos do dogma lastreado em dinheiro contra propriedade pública vai muito além dos trilhos.  As indústrias privatizadas não apenas falharam em servir com eficiência, valor pelo dinheiro investido, responsabilidade e trabalhos seguros.  Elas também sugaram riquezas e o estilo rentista de monopólios incumbentes  concentraram a tomada de decisão sobre Economia cada vez em menos mãos, aprofundaram a desigualdade de renda, e falharam em realizar investimentos essenciais para o crescimento sustentável.

Numa hora em que o setor corporativo inteiro se senta sobre uma montanha de dinheiro não investido e sobre uma produtividade reduzida, a falta de um motor econômico de propriedade pública para guiar a recuperação é essencial.  No caso da Energia, o sistema privatizado está falhando em prover a mais básica meta de investimento – manter as luzes acesas.

A alternativa de regulação mais severa, vista como a alternativa política aceitável, significa tentar fazer por controle remoto, o que é muito melhor feito diretamente e não resolverá o problema por conta própria.  A experiência tem mostrado que não se pode controlar o que não se possui.

Como Andrew Cumber, acadêmico de Glasgow, argumenta num relatório para o think-tank Class, não é apenas através de enormes incentivos e subsídios perversos – bem como os pagos a empresas de propriedade do Governo dinamarquês e sueco para atingir objetivos  – que o Governo é capaz de persuadir monólitos privados a fazer o que o setor público poderia ter feito com custos muito mais baixos.

A necessidade de novas formas de propriedade pública no setor bancário e de utilidades – infraestrutura em energia, transporte e comunicações – é irrefutável.   Um grupo seleto de empresas de propriedade social e democraticamente controladas poderia estabelecer o andamento dos investimentos, reconstrução e mudança para uma “economia mais verde”.

É uma política que tem o apoio da maioria do público, mas  a  elite empresarial considera inaceitável.  Seria proibitivamente cara, eles alegam, e também um retrocesso.  Na realidade, não há necessidade de haver um custo líquido para os bolsos públicos.  Mesmo que uma compensação total a custos de mercado seja paga, seria em forma de troca de ações por títulos governamentais. Os juros sobre os títulos  teriam que ser pagos, mas poderiam ser financiados  com uma fatia do lucro dessas empresas.

Mas, a classe governante do Reino Unido também falhou em perceber o que está acontecendo no resto do mundo.  Dos Estados Unidos e América Latina ao Oeste Europeu e ao redor do mundo, serviços públicos privatizados, utilidades e recursos tem sido trazidos de volta à propriedade pública.  Na última década, em 86 cidades, a água voltou a ser propriedade pública.  Apenas na Alemanha, mais de 100 concessionárias de energia retornaram à posse pública, desde a crise de 2007 e 2008.

Mesmo que austeridade econômica esteja sendo usada para dar fôlego às privatizações, a maré tem começado a fluir em outra direção.  Uma nova onda em favor das propriedades públicas está tomando formas inovadoras e as vezes híbridas, superando a fraqueza que outrora assolava as indústrias nacionalizadas.

Mas, no Reino Unido, o poder da “City” e os interesses instalados nos lucros das privatizações são um grande obstáculo a essa mudança essencial.  A pressão por uma economia genuinamente mista – algo antes considerado a tendência de bom senso – está fadada a crescer,  à medida em que os custos e fracassos do Capitalismo se acumulam.  As ferrovias podem ser apenas o primeiro passo.


Tradução: Renata Vilani