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Lula e Dilma levam trabalhador ao comando

Nas empresas estatais e de economia mista, o trabalhador vai ajudar a decidir sobre o futuro da empresa.
publicado 02/12/2013
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O Conversa Afiada reproduz da Carta Maior "descoberta"do professor Wanderley Guilherme: um dos últimos atos renovadores de Lula e dos primeiros da Dilma.


Para onde vai a mais-valia?



A presença dos empregados nos conselhos de administração pode ser uma providência institucional de significativas e positivas externalidades para o País.

Wanderley Guilherme dos Santos

Em 28 de dezembro de 2010, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou, em um de seus últimos atos, a lei n. 12 353, dispondo “sobre a participação nos conselhos de administração das empresas públicas e sociedades de economia mista, suas subsidiárias e controladas e demais empresas que a União, direta ou indiretamente, detenha a maioria do capital social com direito a voto e dá outras providências”.

Em portaria de 11 de março de 2011, regulando o decreto 7 063, de 13 de janeiro do mesmo ano, e um dos primeiros da presidenta Dilma Roussef, a Ministra de Planejamento, Orçamento e Gestão, Miriam Belchior, punha em marcha aquele que foi um dos derradeiros decretos de Lula. Tanto a legislação original quanto a legislação e portaria posteriores foram explicitamente cautelosos ao vedarem aos administradores (artigo 8º da portaria) “intervirem em qualquer operação social em que tenha interesse conflitante com o da empresa, o conselheiro de administração representante dos empregados não participará das discussões e deliberações sobre assuntos que envolvam relações sindicais, remuneração, benefícios e vantagens, inclusive matérias de previdência complementar e assistenciais, hipótese em que fica configurado o conflito de interesse”.

Em breves palavras, não se tratava de disfarçada fresta de redistribuição de lucros, mas claro recrutamento dos assalariados, via eleição por maioria absoluta entre seus pares, para o condomínio de poder administrativo.

Em palavras ainda mais breves e conforme o nome das coisas: trata-se de incorporar os empregados às decisões sobre o destino da mais-valia, da reprodução da empresa, fundamentalmente no que diz respeito a investimento. Considerando o impacto da nova estrutura decisória conforme o tamanho da empresa, o artigo 1º da portaria esclarecia que o ali disposto “não se aplica às empresas que tenham um número inferior a duzentos empregados próprios”.

Os vinte artigos da Portaria de 11 de março de 2011, mais seus parágrafos e incisos, buscam garantir o caráter produtivo da inserção dos assalariados na administração das empresas, impedindo, no mesmo embalo, o exercício predatório de acumulação de benesses, compadrios e formação de castas. O objetivo consiste em compartilhar com os assalariados as finalidades fundamentais de sobrevivência  e expansão saudável das empresas.

Ora, da perspectiva específica do assalariado o aspecto crucial da empresa refere-se ao mercado de trabalho, à criação e refinamento de empregos e seus requisitos. Para isso, o artigo 32º da Portaria estabelece que “O conselheiro representante dos empregados estará sujeito a todos os critérios e exigências para o cargo de conselheiro de administração, previstos em lei e no estatuto ou contrato social da respectiva empresa”.

A empresa fica protegida quanto à qualidade da representação, os empregados assegurados na participação dos destinos daquele mercado de trabalho, bem como em posição de exigir treinamento e refino dos atuais empregados, no caso em que os investimentos busquem inovação tecnológica. Sem criar barreiras à entrada, a participação do trabalhador na administração das empresas pode defender o mercado atual, por via do treinamento e adaptação. Isto não está escrito na portaria, mas é óbvio que não a desafia, antes a reforça. Do mesmo modo, não se explicita que o conselheiro representante dos empregados deva ter por critério de decisão a taxa de investimento da empresa, mas da relação umbilical entre investimento e postos de trabalho se deriva automaticamente o critério.

Não tenho dados sobre a extensão em que as obrigações da Portaria de 11 de março de 2011 foram obedecidas pela população empresarial pertinente.

Passados dois anos e meio de sua publicação, cabe ao Congresso, aos sindicatos (que, a propósito, devem indicar metade dos membros da comissão eleitoral – Artigo 10º) e aos interessados em geral investigarem se os órgãos referidos pela portaria estão tendo o destino de sua mais-valia acompanhado por conselheiros representantes dos empregados, por estes eleitos. A manutenção do nível de emprego é fundamental para o bem estar da população independentemente das conseqüências políticas desse estado. A participação dos empregados nos conselhos de administração pode ser uma providência institucional de significativas e positivas externalidades para o País.

Entendo ser de tal modo relevante tal iniciativa que indago aos especialistas se não seria o caso de, em diálogo com as representações da classe empresarial, considerar um programa de governo que se comprometa com a extensão do instituto da participação administrativa de representantes dos trabalhadores a certo tipo de mega empresas. Lembro que a extensão da previdência ao campo foi, por décadas, denunciada como antevéspera da hecatombe econômica. Quando efetivada, revelou-se extraordinário incentivo ao desenvolvimento da agricultura, ademais de criar poderosa reserva de mercado consumidor. Lembro ainda aos interessados que o mais cruel ditador do período 1964/1985, Emilio Garrastazu Médici, tornou-se patrono do FUNRURAL, quando começou esse virtuoso capitulo. Cabe especular se a democracia também não é capaz de iniciativas corajosas.