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Vereador e PM queriam a morte de Marielle

Testemunha foi coagida a trabalhar para milícia
publicado 08/05/2018
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Marielle atrapalhava a grilagem de terras (Créditos: Rafaela Cassiano/Ag. O Globo)

Por Antônio Werneck, no Globo Overseas:

Exclusivo: testemunha envolve vereador e miliciano em assassinato de Marielle Franco


Um homem que trabalhou para um dos mais violentos grupos paramilitares do Rio procurou a polícia para contar, em troca de proteção, que o vereador Marcello Siciliano (PHS) e Orlando Oliveira de Araújo - ex-PM preso acusado de chefiar uma milícia - queriam a morte da vereadora Marielle Franco (PSOL), assassinada com o motorista Anderson Gomes, no dia 14 de março, no Estácio. Em três depoimentos à Divisão de Homicídios (DH) da Polícia Civil, ele deu informações sobre datas, horários e até locais de reuniões entre o vereador e o miliciano, que hoje cumpre pena em Bangu 9. Também deu detalhes de como, segundo ele, a execução foi planejada. As conversas entre os dois teriam começado em junho do ano passado. Procurado pelo GLOBO, Siciliano disse que não conhece Orlando de Curicica e afirmou que se trata de "notícia totalmente mentirosa".

Até agora, foram dois depoimentos nas dependências do Círculo Militar, na Urca, e um na sede da DH, na Barra da Tijuca. O GLOBO teve acesso ao relato da testemunha, que primeiramente procurou a Superintendência da Polícia Federal, na Praça Mauá, onde passou a ser acompanhada pelos delegados federais Helio Hélio Khristian Cunha de Almeida, Lorenzo Martins Pompilio da Hora e Felício Laterça, que, após tomarem conhecimento da gravidade dos fatos, procuraram o chefe de Polícia Civil, delegado Rivaldo Barbosa.

No depoimento, a testemunha contou ter presenciado pelo menos quatro conversas entre o político e o ex-policial que, mesmo preso, ainda chefia uma milícia na Zona Oeste. Além disso, forneceu nomes de quatro homens que teriam sido escolhidos para o assassinato, agora investigados pela polícia. O depoente afirmou que, em junho do ano passado, testemunhou um encontro entre o vereador e o ex-PM em um restaurante na Avenida das Américas, no Recreio dos Bandeirantes, cujo nome foi fornecido aos policiais. Ele disse que ouviu os dois falando sobre Marielle.

— Eu estava numa mesa, a uma distância de pouco mais de um metro dos dois. Eles estavam sentados numa mesa ao lado. O vereador falou alto: “Tem que ver a situação da Marielle. A mulher está me atrapalhando”. Depois, bateu forte com a mão na mesa e gritou: “Marielle, piranha do Freixo”. Depois, olhando para o ex-PM, disse: “Precisamos resolver isso logo”— afirmou a testemunha, referindo-se a um menção feita ao deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL), de quem Marielle foi assessora durante a CPI das Milícias, na Assembleia Legislativa do Rio.

Na época da reunião, o ex-PM já era foragido da Justiça. Ele tinha dois mandados de prisão, e, em outubro, acabou sendo preso numa operação da Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas e Inquéritos Especiais (Draco-IE) e da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core).O delator afirmou que o vereador e o ex-PM têm negócios em conjunto na Zona Oeste. Em seus depoimentos, ele mencionou os nomes de pelo menos 15 pessoas, incluindo policiais, bombeiros e empresários, que seriam participantes do grupo comandado pelos dois. Segundo a testemunha, o político dá suporte financeiro a várias ações da suposta milícia:

— O ex-PM era uma espécie de capataz do vereador, que passou a apoiar a expansão do grupo. Pelo que sei, era apoio político, mas ouvi comentários de que a milícia agia em grilagem de terras na Zona Oeste, especialmente no Recreio dos Bandeirantes.

A testemunha disse que esteve presente nas reuniões entre o vereador e o ex-PM porque, por aproximadamente dois anos, foi obrigado a trabalhar como segurança do miliciano, depois que o criminoso tomou a comunidade onde o delator instalava equipamentos de TV a cabo - um trabalho que, segundo ele, estava em processo de regularização. Como foi ameaçado de morte na ocasião, acabou coagido a trabalhar para o grupo criminoso chefiado pelo ex-PM, que mesmo preso controla mais de uma dezena de comunidades na Zona Oeste, entre elas, o Terreirão, no Recreio dos Bandeirantes, e a Vila Sapê, em Curicica. A testemunha acredita que o faturamento mensal da quadrilha seria de cerca de R$ 215 mil.

— Fui coagido: ou morria ou entrava para o grupo paramilitar. Virei uma espécie de segurança dele. Também ficava responsável por levar o filho para a escola; acompanhava a mulher de Orlando para compras em shoppings — disse. (...)