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Saturnino: "Mercado" não produz desenvolvimento

Ideário original do PT precisa ser rediscutido
publicado 18/09/2017
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Conversa Afiada reproduz "Correio" do mestre Saturnino Braga:

PROJETO POTÊNCIA DA PAZ


“O Brasil não tem Projeto Nacional”, é o refrão mais repetido ultimamente nos debates e nas conversas políticas de que tenho participado. Como se a crise terrível que vivemos tivesse ligação estreita com esta carência. Não sei julgar até que ponto este pensamento reflete uma realidade, uma vez que, desde os anos setenta do século passado, tenho tido conhecimento, e até participado com empenho, de iniciativas de formulação de projetos nacionais brasileiros.

PSDB e PT, a meu juízo, podem ter significados bem próximos de projetos políticos para o Brasil. Economia de Mercado, com retração do Estado, é um projeto político de âmbito nacional. Muitos acham, sem deixar de ter uma dose de razão, que o poder econômico totalmente entregue ao Mercado não constitui Projeto Nacional; até porque o Mercado é, essencialmente, internacional, comandado pelo Grande Capital globalizado. Sim, mas é uma escolha política, de grande parte das nossas classes médias, do seu partido que é o PSDB, da maioria do empresariado e da grande mídia; o último golpe do Brasil foi dado, na cabeça dessa nossa elite alienada, expressamente para implantar este projeto político que já teve em vigor nos anos noventa. A extensão desta preferência privatista aos setores da educação, da saúde, assim como da previdência, são aspectos que completam este grande projeto mercadista que considera a ação do Estado sempre menos eficiente, e indesejável por isto mesmo.

Segundo esta perspectiva, então, pode-se considerar a diretriz política do PSDB e seus agregados um projeto político nacional para o Brasil: mercado e empresa privada, ponto final, como nos países ricos do mundo.

Faltaria, por conseguinte, um projeto alternativo, um projeto desenvolvimentista, fundado na convicção de que Mercado pode produzir modernização, enriquecimento nacional que pode melhorar a vida também dos mais pobres, mas não produz desenvolvimento, na definição mais atual da expressão, abrangendo a economia, a autonomia, a justiça social e as manifestações culturais, como argumentava Celso Furtado, nosso maior pensador dos últimos anos.

Então, a carência apontada com freqüência é de um Projeto Desenvolvimentista Brasileiro, isto é, composto de políticas públicas aplicadas pelo Estado, pelo Poder Público, com propósito de produzir o desenvolvimento do País, no seu sentido mais largo.

O PT bem que tentou formular este projeto, no belo esforço de uma audiência nacional prévia à elaboração do PNB, tão bem conduzida em 2003 por Sebastião Soares no Ministério do Planejamento. A Realidade Política, entretanto, as ameaças do Mercado após a eleição de Lula, a Carta aos Brasileiros, a nomeação de Henrique Meireles para garantir governabilidade e viabilizar, pelo menos, as políticas de valorização do salário e de redistribuição de renda, toda esta realidade engavetou o PNB.

Mas o ideário básico do PT, aquele de antes do lastimável envolvimento com a corrupção, subsiste como quase um projeto nacional desenvolvimentista. Que precisa ser rediscutido, aperfeiçoado, mais ligado na industrialização e na ciência, mais renovador na educação para a cidadania, mais atento às ligações da grande mídia com os interesses do Grande Capital, mas é um ideário desenvolvimentista, que envolve o social, o cultural e a emancipação nacional.

Tenho para mim, com renovada convicção, que um dado da realidade nacional da maior ponderação, que não pode deixar de ser considerado na discussão e na elaboração deste Projeto, é a força política da dominação norteamericana sobre a nossa vida política, representando o interesse do grande capital mundial.

E esta mesma consideração leva à proposta de construir o nosso Projeto Nacional fundado no contraste com a característica mais destacada do nosso vizinho dominador do Norte: o seu inimaginável poderio bélico.

Penso, com insistência e consistência, que nosso Projeto Nacional deveria se caracterizar limpidamente como o desenvolvimento de uma Potência da Paz.

Crescimento econômico, sim, ainda que a taxas menores que as chinesas, mas com justiça maior na distribuição da renda e garantias efetivas dos serviços de educação, saúde e previdência realmente para todos; e, mais, autonomia verdadeira nas decisões políticas, internas e externas, pautadas pelo propósito de contribuir, de todas as formas possíveis, para o fortalecimento da ONU e para a consecução da paz mundial.

Vou falar mais sobre isso depois.

Roberto Saturnino Braga