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Crianças relatam a violência policial na Maré

Em cinco dias, seis jovens morreram em operações policiais no Rio
publicado 15/08/2019
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Desenho entregue por criança do Complexo da Maré aos desembargadores: "eu não gosto do helicóptero porque ele atira para baixo e as pessoas morrem" (Reprodução/El País)

O Conversa Afiada reproduz trechos de artigo do El País:

A favela sangra. “Não gosto do helicóptero porque ele atira para baixo e as pessoas morrem”, escreveu uma criança, que não especifica nome ou idade, para os desembargadores do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. O colorido desenho que acompanha a mensagem mostra um helicóptero da polícia com agentes armados atirando em direção ao solo, onde há um traficante mas também crianças. Elas correm. No desenho e na vida real. "Isso é errado", completou o pequeno morador do Complexo de Favelas da Maré, um conjunto de 16 comunidades pobres da zona norte da capital onde cerca de 140.000 pessoas moram.

Mais de 1.500 cartas e desenhos foram reunidos pela ONG Redes da Maré e entregues a Justiça na última segunda-feira junto com a petição de que fosse restabelecida uma Ação Civil Pública que regula e restringe as operações policiais no lugar. Aceita pela Justiça no segundo semestre de 2017, ajudou a diminuir todos os índices de violência ao longo de um ano. Mas acabou suspensa em junho deste ano. Diante do apelo dos moradores, acabou revalidada nesta quarta-feira, restabelecendo parâmetros mínimos para as ações, como a exigência da presença de uma ambulância e o veto durante o horário de entrada e saída de alunos das escolas.

(...) Nesta mesma quarta-feira, soube-se que, nos últimos cinco dias, seis jovens entre 17 e 21 anos foram mortos por balas perdidas durante várias operações policiais em comunidades do Estado do Rio. (...)

Um boletim semestral publicado pela Redes da Maré nesta semana mostra que 27 pessoas morreram apenas no primeiro semestre de 2019, 10% a mais que ao longo de todo o ano de 2018, quando 24 pessoas foram mortas. (...) "Eu tenho a dizer que as operações matam muita gente e é muito triste", relata o menino William em sua carta (...) "Uma vez minha mãe saiu para ver minha avó e deu tanto grito que me escondi atrás da máquina de lavar. É isso o que tenho a dizer."


Reprodução

(...) Ainda segundo o boletim publicado pela ONG, quatro operações policiais utilizaram helicópteros como plataforma de tiro apenas no primeiro semestre de 2019. É o mesmo número de operações de 2017 e 2018 somados. "Senhores juízes, quando vocês mandam ter operação aqui na Maré, os policiais nem avisam. Eles entram de helicóptero (...) Parece que não têm educação com os moradores", escreveu outra criança. Das 15 mortes ocorridas em dias de operação policial, 14 ocorreram quando utilizavam a aeronave. "Quando tem operação, nenhum dos moradores fica na rua porque já sabe que os policiais vão matá-los. Também pensam que nós somos bandidos", conclui a criança.


Reprodução

(...) Wilson Witzel deixou a toga de juiz federal no início ano passado para se candidatar a governador nas eleições gerais. Venceu prometendo abater criminosos armados "na cabecinha". Dito e feito. Desde que assumiu o posto e passou a comandar as polícias Civil e Militar do Rio, vem colocando em prática uma política pública criticada por estimular a violência policial que atinge sobretudo os jovens negros que vivem nas periferias do Estado. Rotineiramente posa para fotografias ao lado de policiais portando fuzis. Também já subiu em um helicóptero da Polícia Civil em Angra dos Reis, às vésperas de mais uma operação na Maré, e presenciou um agente atirando em direção ao solo. Witzel respalda publicamente essa prática.

Dados do Instituto de Segurança Pública, autarquia do Governo, registraram 3.048 letalidades violentas em todo o Estado de janeiro a junho de 2019. Desse total, 881 são mortes cometidas por agentes do Estado. Isto é, 29%. Quase um terço. Recordes históricos são atingidos mês a mês e não contabilizam as mortes cometidas por milicianos ou policiais matadores que não assumem suas ações no boletim de ocorrência. "O caveirão, quando entra aqui, é para nos matar. Ele não entra aqui para uma simples intervenção. O Estado mata sonhos, mata vidas, mata o futuro de pessoas que um dia poderiam estar no lugar da senhora juíza", escreveu outro morador. (...)


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