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Abril de 1968. Quando se ia às ruas

O Conversa Afiada publica texto de Marilia Amorim.
publicado 21/01/2012
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O Conversa Afiada publica texto de Marilia Amorim:

Abril de 1968


Eu tinha 16 anos e estudava no turno da manhã do Colégio Pedro II, seção Humaitá, curso Clássico.


O Pedro II, fundado pelo próprio, era um dos três melhores colégios do Rio, com o C Ap e o Colégio Militar, todos públicos.


A particularidade do CPII residia na maior heterogeneidade social. Embora de classe média, atendia a camadas mais populares que os dois outros.


Além disso, era infinitamente superior em número de alunos, pois contava com três grandes seções: a sede no Centro, primeira a ser criada; a seção norte, em São Cristóvão; e a seção sul no Humaitá.


Tudo isso fazia do CPII o colégio mais forte em matéria politica. Quando ele descia às ruas, era aquela multidão uniformizada.


Era o dia do enterro do Edson Luis e o Pedro II resolveu comparecer em massa à passeata no Centro do Rio.


Quando passamos em frente à minha casa, na Praia do Russel, avistei alguns vizinhos no meio daqueles que olhavam a passeata. Entreguei-lhes meu fichário de estudante e pedi que avisassem a meus pais que eu estava indo para o Centro  acompanhar o enterro.


Afinal, eu havia saído de manhã cedo para as aulas e certamente voltaria para casa mais tarde.


Da concentração na Cinelândia, seguimos para a zona sul em direção ao cemitério São João Batista, em Botafogo.


Na Praia do Flamengo, pessoas desciam dos ônibus e dos prédios para se juntarem a nós.


As janelas cheias de gente.


Quando chegamos à Praia de Botafogo havia anoitecido e, de repente, a rua inteira se apagou. Cortaram a luz para que ninguém pudesse ler nossos cartazes e faixas. Mas, em pouco tempo, já se viam tochas de fogo iluminando o cortejo. E os moradores nos traziam velas.


Próximo ao São João Batista, começamos a murmurar a melodia da valsa do Adeus e a acenar com lenços brancos.


No ônibus de volta, eu imaginava a bronca que levaria de meus pais. Eram umas dez horas da noite e eu chegando em casa de uniforme...


Atravessei a Praça do Russel e lá pelo meio vi que meu pai estava na portaria. Pronto, é hoje! Comecei logo a explicar, “pai, eu estava na passeata”.


Ele me interrompeu: “Você fez muito bem, minha filha. Você foi me representar”.


Marilia Amorim