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Liszt Vieira responde a Edson Santos sobre o Jardim Botânico

O Conversa Afiada recebeu e-mail de Liszt Vieira, Presidente do Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do RJ.
publicado 11/02/2011
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O Conversa Afiada recebeu o seguinte e-mail de Liszt Vieira, Presidente do Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro:

Prezado Paulo Henrique Amorim


O e-mail do deputado Edson Santos publicado no dia 8/2/2011 no site Conversa Afiada traz uma série de inverdades sobre a questão das moradias no Horto e de acusações infundadas ao Jardim Botânico do Rio de Janeiro.


Em primeiro lugar, não faz qualquer sentido o deputado dizer que "a comunidade ocupa a área do Horto há mais de um século e não promoveu nenhum desmatamento". Desde 1863, a área foi destinada para experimentos com espécies nativas junto à Mata Atlântica e experimentos silviculturais, os chamados talhões florestais, que foram destruídos pelas residências de particulares, e também pelo SERPRO. Há farto material bibliográfico registrando isso, com fotos aéreas da década de 1940 mostrando que não havia qualquer ocupação que não tivesse fim conservacionista.


O deputado também afirma que "o Jardim Botânico não é uma unidade de conservação, mas de pesquisa, tarefa que há muito não vem exercendo", acusando a instituição de práticas comerciais. Ora, não exercemos atividade comercial, não sediamos empresas, nem restaurantes. O JBRJ procura integrar cultura, meio ambiente e ciência, a exemplo do que fazem os mais importantes jardins botânicos do mundo.


Somos sim um Instituto de Pesquisas com reconhecimento internacional e nacional, como atesta, por exemplo, o lançamento recente do livro Plantas da Floresta Atlântica e do Catálogo de Plantas e Fungos do Brasil, coordenados por esta instituição e que são publicações científicas de referência nas áreas de botânica e de conservação.


Importante ressaltar também a criação, no Jardim Botânico do Rio de Janeiro, do Centro Nacional de Conservação da Flora - CNCFlora, que tem a missão de coordenar, no Brasil, uma série de ações preconizadas pela Estratégia Global de Conservação de Plantas, documento da Convenção da Diversidade Biológica, da qual o país é signatário. Isso inclui pesquisas, tanto em seus locais de origem como no próprio espaço do Jardim, com espécies da flora brasileira ameaçadas de extinção.


Também é absurdo afirmar que a área do Horto "nunca pertenceu ao Jardim Botânico (…) é área da União destinada historicamente à moradia." O Jardim Botânico sempre foi constituído pela ligação do Horto Florestal com o Arboreto, conforme vasto material bibliográfico e como consta no próprio processo de tombamento do Horto. É inadmissível a tese de que a Instituição está inserida numa área destinada à moradia. Trata-se de uma inversão dos fatos históricos feita pelo deputado. Como bem escreveu Burle Marx em 1969:


“O Jardim Botânico tem sido retalhado e diminuído de sua área, através do constante uso de manobra sorrateira e hábil (…). O Horto é uma gleba de 83 hectares, o prolongamento natural do Jardim Botânico”,  é “ parte indispensável, manancial e área de integração do Jardim Botânico”. A utilização da área para habitação “constitui uma violação das instituições culturais e da história... O Jardim Botânico, com o Horto, se constitui num todo indivisível,  na totalidade da área de 1.370.000m2”.


As informações falsas dadas pelo deputado e suas acusações contra o Jardim Botânico demonstram claramente tanto sua ignorância quanto sua má-fé em relação aos assuntos que concernem ao JBRJ.


Liszt Vieira

Presidente do Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro



Sobre essa réplica, o deputado Edson Santos disse o seguinte:


Prezado Paulo Henrique Amorim


Em tréplica à carta do senhor Lizst Vieira, reafirmo que a comunidade do Horto existe há mais de um século, o que pode ser comprovado por meio de farta documentação histórica. Muitos moradores com idade superior a 80 anos e nascidos no Horto também podem atestar as memórias de uma ocupação anterior a 1940.


O fato da parte do Horto ter sido destinada à moradia se deve ao entedimento de antigos administradores do Jardim Botânico de que, desta forma, estavam valorizando seus funcionários e aumentando sua produtividade. Para exemplificar, podemos recordar que o ex-diretor Paulo Campos Porto permitiu que dois vigias construíssem suas casas dentro da área do Jardim Botânico, à Rua Pacheco Leão, com o propósito de favorecer a vigilância em tempo integral na fronteira do Parque.


Realmente, seria demagógico dizer que não houve desmatamento para a construção de moradias, o que ocorre em praticamente qualquer ocupação humana. No entanto, a área ocupada pelo núcleo habitacional do Caxinguele, por exemplo, era um charco, com muito capim e eucaliptos, o que, imagino, não sejam espécies de especial interesse científico. Apesar disso, o Caxinguele ficou estigmatizado com área de desmatamento e invasão. Embora o desmatamento tenha sido promovido tanto pela comunidade quanto pelos moradores ricos do Jardim Botânico, que em alguns casos desviam cursos naturais de água da Floresta da Tijuca para encherem suas piscinas. A diferença é o tratamento dispensado pelos ambientalistas de plantão, que a todo custo querem remover os trabalhadores, mas que parecem não se incomodar com os condomínios e casas de alto padrão que ocupam área contígua.


Reafirmo que o Horto cresceu numa proporção infinitamente menor do que a cidade e do que o próprio bairro do Jardim Botânico, vide as áreas degradadas pelos condomínios que, juntas, destruíram um espaço 18 vezes superior à área da comunidade.


De forma algum deprecio a importância histórica e científica do Instituto de Pesquisas Jardim Botânico, instituição de renome internacional, que tem um importante papel a cumprir para o desenvolvimento da pesquisa científica no Brasil. E não há qualquer contradição entre este reconhecimento e a defesa dos moradores da comunidade do Horto. Afinal, como a própria Secretaria de Patrimônio da União já constatou, baseada em estudos da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFRJ, é perfeitamente possível conciliar os interesses dos moradores com a expansão das atividades do Jardim Botânico e a preservação do meio ambiente na região.


O presidente Lizst Vieira sabe que sou um dos mais empenhados na busca pelo entendimento entre os moradores e a União, proprietária da área, o que deve indispensavelmente levar em conta os interesses do Jardim Botânico. Na carta original enviada ao Conversa Afiada, estávamos rebatendo uma “reportagem” da revista Veja que, inclusive, ataca a própria administração do Jardim Botânico. Portanto, causa estranheza a virulenta missiva de seu presidente, que, até que se prove o contrário, consideramos um parceiro, e não um adversário, para a construção de uma saída democrática para o impasse.


Há pleno acordo para o reassentamento em local próximo daqueles que estão em áreas de risco, e algumas outras situações poderão ser negociadas, caso a caso. Mas em nosso entendimento, que é o mesmo da Secretaria de Patrimônio da União, os moradores do Horto que são funcionários, ex-funcionários ou descendentes de funcionários do Jardim Botânico, que receberam autorização da própria instituição para construir suas moradias no local, devem permanecer onde estão e terem sua situação regularizada. No Horto, ninguém ganhou casa. As pessoas receberam autorização para construir, o que fizeram a partir do seu próprio esforço e dedicação ao Jardim Botânico.


Saudações fraternas,

Edson Santos – Deputado federal