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O Brasil descobre "O Brasil" do Mino

O Conversa Afiada reproduz post sobre o lançamento, nesta terça feira, em São Paulo, do romance "O Brasil", de Mino Carta:
publicado 26/02/2013
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A carreira do romancista Mino Carta prossegue neste dia 26 de fevereiro, às 19h, na livraria Cultura do Conjunto Nacional, em São Paulo; e no dia 5 de março, no Rio, na Livraria da Travessa, no mesmo horário.

São as noites de autógrafo de “O Brasil”, do mesmo autor de “O Castelo de Âmbar” e “A Sombra do Silêncio”.

Como nos romances anteriores, não se deixe cair no ardil do Mino.

Parecem relatos históricos e, na verdade, são romances.

Obras de irremediável ficção.

Será ?

Aparecem alguns personagens da vida real, embora, dessa vez, Mercúcio Parla não seja um deles, como no “Castelo” e na “Sombra”.

E outros, pura invenção do autor renomado: como Raymundo Faoro, por exemplo, que está de volta.

Assim como Claudio Abramo, os membros da família Mesquita, Geisel, Sergio Fleury, um patético Robert(o) Civita e Mino Carta.

Porém, aí, está a armadilha.

Mino Carta é Mino Carta ?

Como se lê, a certa altura … “o diabo é manco”.

Porque como diz o autor, “quem escreve ficção, ao buscar o plausível, torna-se um deus grego, pega os fados pela mão e os leva aonde entender. Em teoria.”

Em teoria.

Trata-se do romance sobre um asmático.

Que leva o nome de uma batalha que Napoleão perdeu: Abukir.

É que o pai, que lutou na Guerra da Secessão paulista de 1932, é um professor de historia e geografia no Colégio do Estado e detesta Napoleão.

A mãe não ousaria discordar da escolha.

Abukir existe.

É de carne e osso – e farda.

Ele surge no livro em 1954, ao lado do pai, que procura informar-se sobre o suicídio de Vargas.

E aparece um orador fictício, de nome Carlos Lacerda, assim descrito:

“É a voz da Casa-Grade, voz tribunícia na coerência grosseira que chama seu jornal Tribuna, Graco ao contrário … , onde a verdade é o que interessa à oligarquia.”

Outro personagem da vida real, cuja carreira se desenrola, ao lado do Abukir, é Pajé, um proxeneta.

Pajé revela ao filho que o pai leva a cunhada aos cômodos que alugava.

Quer dizer, o pai cometia o pecado capital previsto do decálogo do Nelson Rodrigues: com a cunhada !

“De hipocrisia, na qualidade de filha da covardia; … a clássica covardia do mais forte”, diz Faoro, personagem fascinante.

Ele recomenda ao autor, supostamente Mino Carta, que “não exagere na ironia; o pessoal tende a achar que você fala sério”.

O autor, como se sabe, não pretende ser levado a sério.

Prefere a ironia atribuída a Faoro: “eles querem um país de 20 milhões e uma democracia sem povo”.

Abukir a certa altura se sente fascinado pela própria ousadia, a que sempre se segue um “será?”.

“Será” ?

Ele se pergunta antes de ir ao Congresso de Ibiúna.

Não foi: “é uma temeridade inútil”.

Depois de levar um susto diante do personagem Sergio Fleury, Abukir decide ingressar no jornalismo e abandonar os planos de ser professor ou advogado.

Sobe à categoria de repórter, como certificam os anais do Estadão.

Ali, ele faz notável descoberta: o nome e o endereço do alfaiate do Julio Mesquita Neto.

Quanto ao futebol, teve a oportunidade de ser são-paulino desde nascença, como os Mesquita.

A careira segue célere, calculada.

Na época das Diretas, ele escreve em sua coluna, agora no Globo, destino de todos os Abukir:

“Que esperar do PT, o partido de plataforma vermelha a insuflar, sempre e sempre, até a obsessão, outra revolução com erre minúsculo”.

Notável !

O autor observa: “o pessoal da FIESP inicia a leitura do jornal (O Gobo) pela coluna do Abukir (será assim até hoje ? – PHA), antes mesmo de apurar o que o Dr Roberto pensa da vida.”

A essa altura, o pai, Waldir, protesta: “meu filho, você virou um radical … está pior do que eu.”

Mino Carta – autor ou personagem ? – informa que “dali a dez anos Abukir seria o mais conceituado comentarista político da TV Globo e candidato à Academia Brasileira de Letras”.

Neste ponto, porém, ele já tinha trocado de alfaiate – passou a ser o do Roberto Irineu Marinho.

“A natureza foi muito generosa conosco”, disse Faoro. “Deste ângulo somos únicos, nosso problema são os inoxidáveis donos do poder.”

O autor revela um fatalismo desesperador: “Sísifo talvez seja um homem feliz”.

Mas, não se deixa levar pelas palavras escritas, incauto leitor.

Que o som das ondas de Leopardi leve você, como conduziu Mino: “E naufragar mi é dolce in questo mare”.

Em tempo: seguramente, esses comentários não estão à altura de “O Brasil”. Comece o livro pelo fim e leia o posfácio admirável do professor Alfredo Bosi.


Paulo Henrique Amorim