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Lula: Chávez uniu as Américas e seus povos

Artigo no NY Times celebra liderança de Chávez na união do Sul das Américas. Chora, FHC !
publicado 07/03/2013
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O Conversa Afiada reproduz artigo de Lula, publicado pelo New York Times:


A América do Sul após Hugo Chávez



Por Luiz Inácio Lula da Silva

O presidente Hugo Chávez foi muito importante para a América Latina e deixa um grande legado. A história registrará, com justiça, o papel que ele desempenhou na integração latino-americana e sul-americana, e a importância de seu governo  para o povo pobre de seu país. Mas, antes que a história se encarregue disso, é importante que tenhamos clareza da importância de Chávez no cenário político nacional e internacional. Somente assim poderemos definir as tarefas que se colocarão à nossa frente para que avancemos e consolidemos os avanços obtidos nesta última década, agora  sem a ajuda de sua energia inesgotável e de sua convicção profunda no potencial da integração dos países da América Latina e nas transformações sociais necessárias no seu país para debelar a miséria de seu povo. Suas “misiones” sociais, especialmente na área da saúde e da habitação popular, foram bem sucedidas em melhorar as condições de vida de milhões de venezuelanos.

As pessoas não precisam concordar com tudo que Chávez falava. Tenho que admitir que o presidente venezuelano era uma figura polêmica, que não fugia ao debate e para o qual não existiam temas tabus. E preciso admitir que, muitas vezes, eu achava que seria mais prudente que ele não tentasse falar sobre tudo. Mas essa era uma característica pessoal de Chávez que não deve, nem de longe, ofuscar as suas qualidades.

Pode-se também discordar ideologicamente de Chávez: ele não fez opções políticas fáceis e tinha enorme convicção de suas decisões.

Mas ninguém minimamente honesto pode desconhecer o grau de companheirismo, de confiança e mesmo de amor que ele sentia pela causa da integração da América Latina, pela integração da América do Sul e pelos pobres da Venezuela. Poucos dirigentes e líderes políticos, dos muitos que conheci em minha vida, acreditavam tanto na construção da unidade sul-americana e latino-americana como ele.

Junto com Chávez criamos a Unasul (União de Nações Sul-Americanas), que integra 12 países do continente. Em 2010, a Comunidade dos Estados Latino-americanos e Caribenhos (Celac) saiu do papel e ganhou forma jurídica – e isso não teria sido possível sem o empenho de Chávez. O Banco do Sul, um banco de desenvolvimento da Unasul, não seria possível sem a participação do líder venezuelano. Foi junto com ele também que conseguimos formar a Cúpula América do Sul-África (ASA) e a Cúpula América do Sul-Oriente Médio.

Por isso mesmo que a contribuição de Chávez ao seu país e ao projeto de integração da América do Sul e da América Latina não se extinguirá com sua morte. Se um homem público morre sem deixar ideias, quando o seu corpo físico acaba, acaba o homem. Não é o caso de Chávez, que foi uma figura tão forte que suas ideias permanecerão discutidas nas academias, nos sindicatos, nos partidos políticos e em qualquer lugar que exista uma pessoa preocupada com a justiça social e com a igualdade de poder entre os povos no cenário internacional. E talvez venham a inspirar outros jovens no futuro, como a vida do herói da independência Simon Bolívar inspirou o próprio Chávez.  Isso no campo das ideias.

No cenário político onde essas ideias são debatidas, disputadas e podem virar realidade, todavia, ficar sem Chávez exigirá empenho e vontade para que os ideais do líder venezuelano não sejam lembrados, no futuro, apenas no papel.

Na Venezuela, os simpatizantes de Chávez, para manter o seu legado, vão ter pela frente um trabalho de construção de institucionalidades. Terão que trabalhar para dar mais organicidade ao sistema político, tornar o poder mais plural, conversar com outras forças e fortalecer sindicatos e partidos. A unidade do país dependerá desse esforço.

É preciso garantir as conquistas obtidas até agora. Essa é, sem dúvida, a aspiração de todos os venezuelanos, sejam eles de oposição ou de situação, militares ou civis, católicos ou evangélicos, ricos ou pobres… Todos precisam compreender que somente a paz e a democracia vão permitir que se realize o potencial de um país tão promissor quanto a Venezuela.

É preciso garantir instituições multilaterais fortes para garantir definitivamente a consagração da unidade da América do Sul. Chávez não estará nas reuniões de cúpula sul-americanas, mas seus ideais e o governo venezuelano lá estarão. A convivência democrática na diversidade dos líderes dos governos da América do Sul e Latina,  é a certeza da construção da unidade política, econômica, social e cultural da América do Sul e da América Latina, que tanto precisamos. Um caminho sem retorno. E, quanto mais fortes formos, mais teremos força para negociar a nossa participação da América do Sul nos fóruns internacionais, e sobretudo, para democratizar os órgãos multilaterais, como a ONU, o Banco Mundial e o FMI, que ainda respondem à realidade internacional do fim da Segunda Guerra Mundial e não ao mundo de hoje.

Certamente Chávez fará falta. Ele era uma figura muito forte e ímpar, capaz de fazer amizades e se comunicar como poucos líderes. Precisamos ter a sabedoria de tirar da passagem dele pela Terra e pelo governo da Venezuela as contribuições que podem resultar na consagração da unidade latino-americana. E tenho a certeza de que todos os governantes da região farão um grande esforço para que isso aconteça.  

Eu, pessoalmente, guardarei para sempre a relação de amizade e parceria, que durante os oito anos em que trabalhamos juntos como presidentes produziu tantos benefícios para o Brasil e para a Venezuela.

Carismático e idiossincrático, capaz de fazer amigos com facilidade e de se comunicar com as massas como poucos outros líderes, Chávez vai fazer falta. Eu, pessoalmente, guardarei para sempre a relação de amizade e parceria que durante os oito anos em que trabalhamos juntos como presidentes, produziu tantos benefícios para o Brasil e para a Venezuela e para os povos de nossos países
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Em tempo: o Conversa Afiada reproduz texto de João Pedro Stedile, do MST e da Via Campesina:


O povo da América Latina perde um líder e um construtor de ideais!



João Pedro Stedile
Do MST e da Via Campesina

A morte de Hugo Chávez representa uma perda irreparável para todos os povos da América Latina.

Sua origem humilde, sua trajetória de militar nacionalista e seu compromisso inquebrantável com um projeto de libertação do povo venezuelano, o transformou num líder popular de todo continente.

Foi o primeiro a enfrentar de armas em punho as mazelas do neoliberalismo na década de 90. Amargou a prisão. O povo o reconheceu e o conduziu ao governo com o maior apoio eleitoral da história do país.

Promoveu mais de dez eleições, com ampla participação popular e com extremo rigor de controle popular sobre a lisura das urnas. Ganhou todas.

Enfrentou o império e a mídia burguesa de todo o mundo.

Enfrentou os empresários lumpens e corruptos marionetes da CIA que lhe deram um golpe. Mas o desdenhado protagonismo do povo o salvou!

Nesses anos todos, implementou mudanças fundamentais na sociedade venezuelana.  Depois de um século de uma economia dependente das exportações do petróleo, deu uma virada.

Primeiro distribuiu a renda petroleira para resolver os problemas do povo.  De saúde, educação, moradia e alimentação.

E depois implementou mudanças para reorganizar a economia com um processo de industrialização do país e de autonomia.

Na política, incentivou todas as forças a participação popular. Não apenas nos processos eleitorais e governamentais, mas estimulou o protagonismo dos trabalhadores em todos espaços da sociedade.

Solidário com outros países mais empobrecidos, criou a Petrocaribe, que vende a preço de custo o necessário petróleo.

Como MST e demais movimentos da via campesina, sempre tivemos uma identidade muito grande com seu projeto. E um carinho especial por esse líder comprometido unicamente com seu povo.

Conhecemo-nos em atividades do Fórum Social Mundial (FSM) para debater o neoliberalismo e as saídas para a crise capitalista.

Construímos juntos uma proposta continental de agroecologia, que pudesse servir de base para uma política de produção de alimentos sadios para toda população.  Organizamos uma rede continental de escolas de agroecologia e de experimentos de sementes, nossa rede IALA (Institutos Agroecologicos Latinoamericanos).

E juntos colocamos as bases para um projeto de integração continental, porém popular, que fosse mais além das articulações governamentais e comerciais. Que pudesse servir de integração popular, com iniciativas produtivas. Com iniciativas educacionais para erradicar o analfabetismo de nossa população. De iniciativas sociais e políticas. Para tanto, estamos construindo uma articulação de todos os movimentos sociais da América que se identificam com esse projeto.

Foi uma década de derrotas para o neoliberalismo, para os setores da burguesia, e aos  eternos serviçais dos interesses do capital estrangeiro.

Foram dez anos de construção de um processo de alternativas. Com desafios enormes, vitórias e pequenas derrotas, mas sempre para frente!

Chávez nos fará falta!    

Mas com a intensidade de um líder verdadeiro, colocou as bases fundamentais na sociedade venezuelana para que o projeto tenha continuidade.

Seu exemplo e lucidez servirão de ânimo para toda militância social da América Latina, para todas as forças populares e para os governos progressistas para que se possa seguir construindo processos de verdadeira libertação popular.

Processos de verdadeira integração continental.   

Viva Chávez!  Viva a integração popular de nosso continente!